25.8.09

Vestido vermelho

O teu vestido vermelho amarfanhado no chão
na frente do antigo espelho que refletia tua boca

Você, em teu devaneio, divagava fevereiro
enquanto a minha cabeça percorria os outros meses

O teu perfume e teu beijo voaram pela janela
aberta do apartamento marcando em alto relevo
teu nome na minha pele

Mas os meus poros expelem, rejeitam as tatuagens e até inflamam as vezes

Os meus olhos continuam vagando pelas estradas
buscando a mulher alada parecida com você
bem assim como teus dedos tateiam o espaço escuro
em busca de um homem puro que habita teus desvarios

Teus passos rolam macios em avenidas da Europa, da Ásia, da Oceania...

Eu, por meu lado, me apego aos prazeres de Caxias
ou à doce anatomia ondulante e flexível das doidivanas de Copa

Eu sempre escancaro a boca em gritos desesperados por amor e liberdade
Pra você basta um controle de TV, uma novela ou qualquer coisa que engane
o cérebro transparente enquanto a paixão se evade

Ainda sinto teu cheiro, confesso. mas sempre tapo as narinas
em respeito as meninas que voam por minha cama

É claro, elas não amam e nem conhecem meu jeito
mas sabem a espessura das grades que me azucrinam

Nada começa em meu quarto e também nada termina

Amores são só amores e as cores do arco iris embaralham a retina
desfocam a imagem pura e espalham sentimentos confusos por toda parte

Poesia vem de marte, mortificação, de Vênus

Se eu conseguir, pelo menos, equilibrar morte e vida já vou me sentir tranquilo
para explorar o planeta e caminhar pelo tempo com as minhas próprias pernas

Por mais que se diga o oposto, as noites são sempre eternas e o gosto do amor escorre
por quase todos os lábios desde o começo das eras

Na verdade, a antiguidade é igual aos nossos dias em termos de amor e drama

Madalena fez a cama de discípulos insones. Sherazade seduziu e devorou muitos homens

Cleópatra arrebatou um império poderoso ostentando como arma apenas os seus encantos

Os amores foram tantos na história da humanidade
que homens criaram deuses para confundir verdades
difíceis de absorver, compreender e falar na cama ou até na sala
diante de outros seres

Mas você, com suas neuras e seus milhões de afazeres não sabe de nada disso

Até mesmo teu sorriso parece meio postiço oculto por velhas dores
sonhos escorregadios e manchas de leite morno

Ficava em mim o transtorno cruel e obsessivo por ver, assim, teu vestido,
jogado no chão do quarto amarfanhado num canto

Todo dia eu me matava. Nem sei bem por que servia a bebida em duas taças

Eu bebo e brindo a trapaça, você bebe por beber

Nas avenidas de Londres, Budapeste e Manágua a euforia e a mágoa
se misturam em você que, tola, nunca percebe a corrosão dos desejos

Teus dedos tocam na neve espessa do Canadá, afagam balas na guerra,
jogam dados no cassino e eu quase nunca atino para as loucuras que inventas
- demônios, chuvas, tormentas - pra te tornares amarga

Amo uma e outra fada, passeio por entres as pernas
das meninas nas calçadas e nunca penso em você

Quando me concentro em nada, abro meu peito na estrada
e me espalho no planeta clamando amor e gozo

Meu mundo gira de novo no mesmo tempo e espaço a que estou acostumado

Mas sempre que ultrapasso as fronteiras de você me esqueço do que fazer

O tempo apagou os traços da nossa cumplicidade

O que me resta é a tarde e o sol descendo na linha preguiçosa do horizonte

Te absorvi anteontem e talvez até recorde de você um dia desses
quando eu estiver cansado de beber em outras fontes

Mas hoje, nem mesmo um fardo eu me sinto carregando

Apenas penso nos anos, nos sumos desperdiçados por febre, fome ou fastio

O amor começa eriçado mas vai perdendo a tensão até que fica vazio

Os trilhos por que trafego quase sempre dão num rio empanturrado de amores

Fragrâncias, tons e sabores dispostos no mesmo espaço
sempre ao alcance dos braços dos olhos e dos sentidos para os fins mais variados

Eu nunca me sinto ilhado banhando-me nessas águas impregnadas de cores

Pelo contrário, minha alma fica mais leve, e passeia
Se espalha na superfície, se esfrega, embriagada, em cada palmo de amor

Submeto-me, de bom grado à sensação de torpor como um Dionísio dopado
por inalações lascivas

Espírito serenado deixo fluir minha febre nessa profusão de cheiros que explode dos corpos todos

Vejo na frente do espelho o teu vestido vermelho e rio do meu esforço
para adivinhar teus passos por alamedas escuras

As águas fluíram em março e desbotaram o esboço que havia de você

Hoje à noite vou beber o vinho mais saboroso no cálice virtuoso da minha musa mais bela

Um sorriso de aquarela estará naturalmente emoldurando meu rosto.

7 comentários:

Unknown disse...

LINDO DEMAIS. LINDO DEMAIS. LINDO DEMAIS. SIMPLES ASSIM.

LEILA NEGRELLOS

Vicente Portella disse...

Valeu Lelinha. Obrigado, meu anjo.

Anônimo disse...

ooooooooooxe....

Será que eu entrei no blog certo???

Ou o dono deste blog foi abduzido e sua veia blogueira recebeu altas doses de "Não para, não para, não PAAAAAAAAAARA'???

Escondendo o jogo né? E a gente achando que a única sacanagem que habitava esta mente era a que acontecia na política.

PERIGO esse homem!

Acho até que vou comprar um vestido vermelho amanhã.....

bjos...de batom vermelho

Vicente Portella disse...

Valeu Atrê...

Quero te ver de vestido vermelho...rs

Beijos

Anônimo disse...

Vicente, Vicente... :)
Saudade da banda lírica do teu texto.
Mata a pau.

'té+
heraldo hb

Unknown disse...

Quanto tempo nao lia um bom poema vicentino
saudade

Aline Dias disse...

Puts faco minhas as palavras do companheiro aí de cima"saudades da poesia Vicentina".-Molhei até a calcinha.BJK cumpadre.