2.5.10

Zeca Baleiro - Antes do Show em Caxias o artista conversou com o Jornal Imprensa

Entrevista:Adilson Sarpi Fotos: Rafael Barreto

O cantor e compositor Zeca Baleiro (batizado José Ribamar Coelho Santos) fez uma bela apresentou no Teatro do SESI de Duque de Caxias no dia 9 de abril. O show foi o primeiro da serie no circuito cultural SESI-RJ, tendo como ponto de partida Duque de Caxias, percorrendo depois todos os Teatros SESI do Grande Rio. A apresentação foi uma retrospectiva de sua carreira e que durou quase duas horas. As canções foram valorizadas em arranjos acústicos de Tuco Marcondes, responsável pelas guitarras, violões e vocais. O repertório incluiu criativas baladas já consagradas pelo público como “Telegrama” e “Quase nada”, além de composições do CD “O Coração do Homem-Bomba, Ao Vivo (Ao Vivo Mesmo)”, CD lançado em dezembro, o décimo autoral de sua carreira. Em 1997, ano em que lançou o primeiro disco, “Por onde andará Stephen Fry?”, foi escolhido o “melhor cantor” pela Associação Paulista de Críticos de Artes.




Aqui em Duque de Caxias, como nas demais cidades da Baixada Fluminense, temos uma população que “respira” a cultura nordestina, pessoas que vieram das regiões Norte e Nordeste. Como você, que está vindo pelo Circuito Sesi, percebe isso?

Zeca Baleiro - Na verdade, eu já toquei aqui na região, algumas vezes. Em Nova Iguaçu, em alguns lugares do povo, no Rio, em Lonas Culturais, que também tem esse perfil. É essa “mistura louca” do Brasil, né, bacana. E é um povo que sempre me surpreende, é muito bem informado. Vai de encontro aquele clichê de que as pessoas da periferia do Brasil não têm informação, não tem cultura. Acho bacana isso, gosto de viver esse clichê contestado. As pessoas me pedem coisas que eu já nem sei mais tocar, o lado B do meu disco... (risos...) O que mostra que é uma gente que conhece profundamente.

Isso te sensibiliza, saber que o público está antenado com sua música, com seu trabalho?

Zeca Baleiro - Sim, até por uma fome própria. Porque as pessoas tentam fazer um bom trabalho, porque sabemos que não é fácil realizar um circuito como esse que estou fazendo, seis sete, shows, é muito difícil. E essas pessoas que moram nesses lugares, estão naturalmente mais afastadas dos eventos culturais que estão acontecendo. E mais difícil, por exemplo, uma exposição interessante sair lá do centro do Rio ou de qualquer outra instituição e vir pra cá. Então as pessoas têm que se deslocar, a “fome” tem que ser maior para as pessoas buscarem essa informação.

Você sente essa conexão com o Maranhão, com o subúrbio de lá, com as regiões periféricas?

Zeca Baleiro - Acho que periferia é periferia em qualquer lugar. Não dá pra comparar a periferia do Rio com a de São Paulo, a de São Luiz, ou de qualquer outro lugar. Mas o nome já é metafórico, explica tudo. O fato de eu ser do Maranhão faz com que eu me sinta também de uma periferia. Da periferia do Brasil, se você pensar em termos nacionais. Eu e minha geração, meus amigos músicos, artistas, a gente também se sentiu por muito tempo apartado de tudo. Hoje com essa tecnologia toda, essa revolução digital, as pessoas lá do interior do Maranhão têm acesso as informações que a gente não poderia ter. Eu me lembro pra comprar um disco, tinha que ser por reembolso postal, pagar o selo, uma dificuldade. As lojas não achavam os paradões de sucesso. É o que eu te digo, a “fome” pessoal de cultura e de informação tem que ser maior, pra compensar a falta.

Esse show que você vai fazer agora, abre uma série de seis apresentações do Circuito Sesi. É isso?

Zeca Baleiro - Sim. Hoje faço aqui, amanhã faço Jacarepaguá, e volto semana que vem a Itaperuna, Centro do Rio, Macaé, Campos...

Com um palco pequeno, o show é mais intimista? Como é isso?

Zeca Baleiro - Sim. Naturalmente e é inevitável. E agente cria uma atmosfera que propicia isso. Sou eu e o Tuco Marcondes, só, que é um músico que toca vários instrumentos e tal... Mas a própria atmosfera então pra criar mesmo essa atenção, essa concentração. É diferente de tocar em uma praça, com banda, coisa que eu costumo fazer, e que também gosto de fazer, não tenho nenhuma preferência. Mas aqui eu acho que cria outro tipo de atenção, rola muita conversa, pra “desmonotizar” o show. É legal papear, eu sinto que as pessoas gostam da prosa, a gente conta a história de como nasceu certa música, “causo” e etc... e eu adoro fazer esse formato. E também faz tempo que eu não faço coisas aqui no Rio, digamos nesse extrato, nessa esfera. Eu tenho feito shows de turnê mas circuitos normais, Circo Voador, Canecão... Mas eu adoro fazer, já fiz outras vezes em outras instituições também e adoro. Vem aí um público até atípico, né, que tem essa oportunidade, do lado de cá, na rua, no bairro (risos)...

E você no circuito internacional. O “Rock in Lisboa” que será no mês que vem, é sua primeira experiência internacional?

Zeca Baleiro -
Não, eu tenho feito coisas...

Nesse porte?


Zeca Baleiro É, um evento nesse porte, acho que é primeira vez. E também num contexto diferente, que é um palco alternativo onde vai rolar encontros entre artistas brasileiros e portugueses, que os produtores julgam que temos afinidade. Eu vou dividir o palco com Jorge Palma, que é um cantor, compositor meio com o pé no blues e no rock, assim. Muito interessante. Martinho da Vila também vai participar, acho que vai ser um evento bem bacana. Portugal é um lugar onde eu tenho ido há uns 10 anos. Meus discos têm sido lançados lá. Nos outros lugares são coisas mais eventuais, na Argentina também, eventualmente tenho acontecimentos assim, mas Portugal é uma coisa mais regular. A Som Livre de lá que se extinguiu não sei por que, no início da minha carreira, lançou uns 4 ou 5 discos meus lá.

É uma “veia lusitana” então?

Zeca Baleiro - (Risos...) É a “veia lusitana”... tá lá... e é um lugar bacana. As pessoas têm muita curiosidade por brasileiro, assim, o ano inteiro lá. De Ivete Sangalo a Adriana Calcanhoto. Tem um espaço muito grande lá. Pelo menos uma vez por ano, a gente faz alguma coisa lá.

Pegando o gancho desse circuito que você está fazendo, do “Rock in Lisboa”, como é a questão da fama? Isso te assusta, já assimilou? Como você administra isso?

Zeca Baleiro - Vai mudando com o tempo, né cara... A fama sempre foi para mim, isso é bem pessoal, a conseqüência do trabalho público, seja o jogador de futebol, ator, locutor, cantor, que se expõem publicamente. Naturalmente você conquista alguma fama em maior ou menor grau, né. E pra mim isso sempre foi uma coisa assim.... Eu nunca desejei “fama”. A fama nunca foi um objetivo pra mim. Hoje há uma inversão tamanha de valores, as pessoas desejam primeiro ser famosas e os “Big brothers” aí da vida estão pra legitimar isso. Primeiro desejam ser famosos, depois têm o trabalho, né. Primeiro conquista a fama, depois vai estudar pra ser atriz e tal, isso é uma inversão completa. A fama deveria ser uma decorrência, uma conseqüência de um trabalho bem feito, de um tempo de estudo, de uma maturação qualquer. Isso tudo que eu falo não é um estudo acadêmico, mas eu criei minha “cartola”. Meu primeiro disco foi gravado aos 31 anos, tardio se comparado a outras gerações, como do Chico Buarque, que grava muito cedo, com 19, 20 anos. Mas pra mim foi bom, passei dos 20 aos 30 me enlouquecendo, me perdendo, me achando na vida e criando meu repertório, de tudo que eu faço hoje. Então a fama veio em decorrência disso. Já me assustou mais, hoje em dia não. Eu aprendi.

Você consegue andar nas ruas tranqüilamente?

Zeca Baleiro - Ando, tomo café na padaria, converso com as pessoas, recebendo uns tapinhas nas costas, dou uns também (risos...).

É uma questão de postura?

Zeca Baleiro Tem que desmistificar um pouco, não supervalorizar. É difícil porque, se você aparece na televisão, se você tem uma atividade pública, as pessoas às vezes te colocam. Não é nem você que se coloca, as pessoas às vezes vem com receio de falar com você. Tem assédios super simpáticos: “Poxa, minha filha te ouve desde a barriga, tem três anos, adora suas músicas”, são coisas super simpáticas de ouvir, prazerosas, que alimentam seu trabalho. Você também tem os desagradáveis, mas... Às vezes você tá lá no aeroporto, caidão, cansado, desanimado, deprimido. Aí vem alguém e fala que “você” foi importante em sua vida. Uma vez num pós show, veio uma moça grávida, com um cara. Aí ele falou assim “Tá vendo isso aí? foi a lenha” (risos...) É o nome de uma música minha, né... Aí você passa a fazer parte da vida das pessoas, eu acho isso muito bacana.

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