24.4.07

Exílio voluntário


Como qualquer ser humano que se preza, e considerando que o ser humano é um animal político, resolvi tomar uma atitude extremamente radical, aos moldes dos velhos e bons guerrilheiros de 64. Frente a ditadura da mesmice e da hipocrisia; diante do caos político instalado no País, principalmente nas instancias intermediárias do poder, completamente tomadas por idiotas, obtusos, bandidos públicos e fascínoras políticos de toda sorte, optei por um exílio voluntário.
Abri mão dos largos benefícios conferidos a mim por minha terra natal, a outrora velha e boa Duque de Caxias, e exilei-me na Lapa. Não exatamente Lapa, é verdade. Mas entre ela e o Bairro de Fátima.
Confesso aos amigos que os sacrifícios aqui são enormes, fantásticos, incomensuráveis...
Para se ter uma idéia, quase todas as noites sou obrigado a conviver com uma gigantesca estrutura cultural que espalha-se pelas ruas e invade indiscriminadamente casas, prédios, bares, lojas etc...algo terrível para quem havia se desacostumado destas práticas desde a ascenção do império Zitumano, quando a atividade cultural foi abolida em minha cidade natal, até os dias atuais.
Ver-me agora anexado novamente a toda uma gama de atividades artíscas causa pânico, paúra, desnorteamento. Para regozijo deste pobre escriba, no entanto, a sorte as vezes nos sorri. Não raramente temos encontrado outros refugiados vagando artísticamente pelas bares, becos e casas de shows dessa que é a terra que me serve como abrigo.
Jorge Bodart, vire e mexe empresta voz e violão ao Dom Lucas, na Men de Sá, e torna a vida de exilado algo plenamente suportavel, diria até interessante, ou mais, gratificante.
André Vianna e a troupe do Nosso Canto aportaram dia desses no Cais da Praça Máua, algo fantástico para quem ja não conta com a sombra proporcionada pelas palmeiras da boa terra, nem mais escuta o canto do sabiá, que, pelo visto, tambem abondonou a terra natal e se refugia por essas plagas.
Até mesmo o Mate com angú, do jovem e bom HB, novo libélo de resistência cultural duquecaxiense tem desfilado por aqui, no Circo Voador, coroando de exito uma ainda curta existencia povoada por criatividade, cultura e indignação.
Não. Não me limito às visitas patrícias, pois meu exílio é amplo, geral e completamente irrestrito.
Para adequar-me a nova terra sucumbo aos seus encantos, mesmo que para mim, as vezes seja um martírio. Imponho-me a frequencia ao Bar Brasil, não somente pelo prazer e muito menos por este oferecer, talvez, o melhor chope do mundo, mas pela busca da adaptação. Bebo um chope e os olhos lacrimejam pois vem-me a lembrança do meu segundo lar, o Mira Serra. Mas, mecanicamente, após um parco momento de angústia, sigo para o Nova República, um rodísio justo e quase perfeito. E depois, geralmente, vago pela Lapa, mais ou menos, creio, da mesma maneira que Chico vagava por Roma e Caetano por Londres. Acalanta-me, no entanto, o belo desfilar de beldades. Moças de todas as partes. Como diria Vinícius, umas difíceis, outras fáceis, exatamente da forma mais correta que há para se extrair toda a poesia da vida.
Como não sou Pero Vaz e a vida caminha, encerro aqui este relato que se trata do meu exílio. Voluntário, é bom que se diga, nesta terra em que se cantando, quase todas dão.
Abraço fraterno aos patrícios com os votos de que nossa terra um dia volte a ser governada por seres humanos normais. Se é que isso ja ocorreu em algum momento.

Sem mais, despeço-me
Da Lapa par o mundo, Vicente Portella

7 comentários:

Anônimo disse...

Fala, Vicente. É bom ter notícias suas, depois de um tenebroso sumiço. Resta-nos, agora, torcer para que as coisas melhorem por aqui para que você possa ser seduzido a voltar e permitir que
compartilhemos nossas amizades e as coisas boas da vida.
Um forte abraço, irmão.
Do amigo Josué Cardoso

provisoriedade disse...

porra, Vicente, num faz chorar não, caralho...
de fato, caxia cansa.
blergh.

Gilson Saraiva Alves disse...

Adorei o texto sobre um dos maiores redutos da boemia carioca, a Lapa, esse bairro que há anos é frequentado por artistas dos mais diversos estilos, e o trocadilho com Pero Vaz de Caminha e a paródia da carta que este enviou pra Portugal foram ótimos. Está de parabéns!

Cidade de Duque de Caxias disse...

O que é que eu vou dizer? Já disseram tudo. Ah! Portela, o Império Zitomano caiu, mas um pior chegou para substituí-lo: o Império Washintomano. Formado por valentes e ignorantes demolidores, está devastando a cidade. Quando passam, não fica pedra sobre pedra. Tudo vira pó. Foi "tinhosa" a batalha desse "incrível exercito" contra a CUMT. Afinal, que história foi aquela? Me ajude a entender, Portela. Por favor, amigo. O que motivou aquela devastação. Nem árvores sexagenárias foram poupadas. Parecia que iam construir sobre os escombros da velha fábrica uma verdadeira Babilônia. Nada aconteceu. E agora, José?
Fui................................

Cidade de Duque de Caxias disse...

Coloque a ? para mim depois da palavra devastação.
Obrigado.

Anônimo disse...

Portella: você é filho da Baixada e uma de seus mais expressivos ativista cultural

Anônimo disse...

Portella,
Primeiro um esclarecimento:não fui o autor do comentário, em linguagem chula, atribuído ao "Stélio". Quem chamou minha atenção para o baixo nível foi nosso amigo Rogério Torres.
Quanto ao "exílio voluntário", acredito que não terá vida longa, pois suas contribuições à vida cultural de Caxias são marcantes.