25.1.11

Maria Bethania - O quereres

A voz da alma humana

Não sou muito de assistir a GNT, o canal é altamente moderno e eu às vezes ainda me atrapalho com essas coisas da modernidade extrema, mas ontem a GNT reprisou um programa de 2006 sobre Maria Bethânia. Não resisti, confesso. Foram duas horas de relógio pregado diante da TV. Na verdade nem percebi que estava com tanta saudade daquela voz avassaladora, daquela interpretação mítica, daquela musicalidade tão profana e tão sagrada ao mesmo tempo.
Bethânia canta o amor, todo mundo sabe, mas canta também a dor, a ousadia, a vida, as cores e tudo mais que há de bom espalhado pelo planeta. Ela é toda sentimento. Sua voz na verdade, se fosse algo visível e palpável, poderia ser definida como um gráfico da capacidade humana de sentir, em todos os sentidos.
O Brasil sempre foi rico em arte e cultura. Passearam pela nossa história artistas fantásticos que salpicaram em nossas almas suas obras geniais e é nesse panteão, onde brilham e coabitam todas as estrelas, que se pode dizer: Maria Bethânia é demais.
As canções se soltam de sua garganta como se estivessem sendo libertas do cativeiro, como se a voz fosse um meio físico para transportar as notas, sons e murmúrios  para um mundo melhor, para o paraíso da sonoridade.
E Bethânia fala, canta, sussurra, sugere, impõe, debate com seus músicos, disserta sobre Chico, Caetano e Gil, ouve embevecida, a mãe, Dona Canô, dando aula sobre como viver a vida... Tudo acachapantemente belo e maravilhosamente distante daquela perfeição técnicista e robotizada. Belezas e não belezas humanas emanam de cada canção que sua voz liberta. Purificando o subaé e, pelo menos no coração de quem escuta, mandando todos os malditos embora.
Evoé Maria Bethânia !

24.1.11

STF: vítima de ditadura por vontade própria

Já faz algum tempo que eu venho defendendo a tese de que o Brasil está retroagindo e que isso se dá em vários aspectos. Moral, dignidade, política, administração pública, instituições... Tudo vêm desmoronando terrivelmente diante dos nossos olhos e não fazemos nada. Quando a ditadura foi implantada pela força a gente até reagiu, mas agora, quando uma nova ditadura é implantada pelo poder de convencimento dos poderosos, a gente se cala e acaba até achando tudo muito bonitinho.
Li na Folha de São Paulo hoje que o STF, a Suprema corte brasileira, passou a usar uma codificação especial, baseada nas iniciais dos nomes, para proteger os poderosos que “eventualmente” estejam sendo investigados. Se houver algum processo contra o Lula, por exemplo, o código pode ser LILS, ou LIS, ou coisa parecida. Na prática, nenhum mortal como tem mais o direito de saber se algum homem público responde processo no STF e muito menos o porquê de tal processo.
Não satisfeito com implantação do sigilo de injustiça, o nosso nobre Ministro Peluzo proibiu também qualquer cidadão de ter acesso à informações processuais. Mesmo advogados, agora, para conhecer o teor de um processo precisa se cadastrar e contratar os serviços de uma empresa que VENDE uma senha de acesso inspirável em 30 dias. Maravilha, né? Nosso judiciário, tantas vezes defendido por agressões sofridas nos tempos da ditadura, inventou para si próprio a autocensura com objetivo de agradar aos poderosos.
Nada prova de forma mais escancaradamente o aparelhamento que nossas instituições vem sofrendo. E pior, o aparelhamento chegou ao STF. Se a própria Suprema corte se permite, de bom grado, a profanação de um dos fundamentos mais elementares da democracia, que é a publicidade dos atos, e, consequentemente dos processos, a quem mais poderemos recorrer? Trata-se da coroação do retrocesso, de uma ode ao atraso, da mediocrização do poder público.
O fato é que, pela nova orientação POLÍTICA  do STF, eu, você que me lê e qualquer outro mortal comum, em caso de processo judicial, pode ficar exposto à toda sorte de especulações, mas os poderosos não. Para eles há uma codificação especial par que suas excelências não sejam incomodadas na hora de responder por seus atos públicos. É com se a nação fosse um corpo humano e o princípio democrático só tivesse valor legal do pescoço para baixo. A cabeça estaria completamente impune a questionamentos para que pudesse se manter impune.
Na verdade Peluzo não revogou apenas o principio da publicidade, mas também o da imparcialidade para a suprema corte brasileira. A partir de agora é oficial, a justiça trata os poderosos com uma mão e os mortais comuns com a outra. Uma tem o hábito da carícia, outra, o do chicote. Você pode imaginar qual delas é dedicada a nós, pobres e despossuídos de poder ( por usurpação).
Que Deus tenha piedade de nossas almas...

12.1.11

A tragédia lucrativa

Vivemos uma época em que não há mais estadistas. Eleitores menores e urnas eletrônicas adestradas elegem governantes igualmente menores, imbuídos mais do senso de “oportunidade” do que de qualquer outra coisa.
Nesse sentido, tudo passa a se transformar em “oportunidade”, não para realizar, construir, resolver problemas da população ou colocar seu nome na história. A “oportunidade”, para nossos governantes se resume à questão monetária. Dinheiro, grana, bufunfa, faz-me rir, cascalho, ou como queira chamar cada um dos cultos assessores que os cercam.
Recentemente os governantes do Rio de Janeiro, Governador Cabral e seus aliados em variadas prefeituras, perceberam uma fonte inesgotável de oportunidades: as chuvas de verão.
O primeiro a transformar as águas do Rio em “oportunidade” financeira foi Eduardo Paes, Prefeito do Rio, cancelando todas as obras de dragagens, limpeza e desobstrução de Rios, bueiros e canais. Quando chega a chuva a cidade vira o caos, então o Prefeito ganha a “oportunidade” de contratar todo e qualquer serviço sem licitação, ou seja, pode pagar 1 milhão à empresa de algum amigo pelo aluguel de um bote salva vidas por algumas horas e ninguém pode reclamar de nada. A lei o garante.
O esquema deu tão certo que Paes o exportou para Prefeituras controladas por partidos aliados e a coisa virou uma mina de ouro, proporcionando tragédias colossais ano após ano e fazendo a felicidade dos governantes.
Lembro que quando Marcelo Alencar era Prefeito a limpeza de bueiros e canais para evitar enchentes era muito debatida. Saturnino Braga havia falido a Prefeitura e não havia dinheiro nem para a merenda dos estudantes, mas Marcelo deu um jeito de bancar as desobstruções para evitar enchentes. Durante o período Cesar Maia a coisa também caminhou tranquilamente, com investimentos em encostas para evitar tragédias.
Nas cidades do interior do Estado e mesmo da região metropolitana nem se falava nisso. Era raro ocorrer algo mais drástico do que uma enchente provocada pelo transbordamento de um Rio.
Mas a coisa agora virou moda. Nas cidades praieiras e serranas há uma combinação entre liberação para construções irregulares para ricos – como foi o caso do Luciano Huck em Angra – e o completo abandono das galerias e canais de escoamento das águas fluviais. Pronto. Simples assim. As tragédias são iminentes, mas os lucros também são vastos e garantidos.
Na verdade é uma pena que o Rio de janeiro, espelhando-se em picaretas que governam em esfera nacional, tenha se transformado nisso. Uma mera central de negócios.
Logo após o fim da ditadura militar dizia-se que o Rio de janeiro tinha um povo lúcido e politizado... O que será que acabou tão rapidamente com a lucidez desse povo?

Vicente Portella

11.1.11

Água de beber... para a Baixada Fluminense

A história se repete todo ano: chega o verão e as pessoas que moram na Baixada vivem o desespero da falta d’água. Isso se dá por dois motivos básicos, aumento de consumo e estabelecimento de prioridades.
Quase todo o abastecimento da Baixada é feito pelo sistema Guandu, que atende toda a região metropolitana e, apesar de ter sua estação de tratamento na Baixada, tem como foco maior o abastecimento da capital do Rio de janeiro.
Nossa cidade, Duque de Caxias, recebe água de 3 sistemas. As represas de Xerém e Mantiquira cobrem cerca de 15% da distribuição e o sistema Guandu entra com os outros 85%. Quando chega o verão, no entanto, o sistema se torna caótico.
Historicamente o abastecimento de água da capital passa pela baixada desde o começo do século passado, mas, naquela época, não existia nenhuma demanda. A população pequena e os rios limpos garantiam o atendimento das necessidades de água com tranqüilidade, mas hoje o que prevalece é o drama de uma população imensa sem atendimento.
O problema de abastecimento de água da Baixada, no entanto, pode ser resolvido plenamente antes do próximo verão. A coisa depende apenas da nossa capacidade de exigir as obras corretas para que isso ocorra.
Existe um projeto do Engenheiro Flávio Guedes, especialista em saneamento e meio ambiente e também ex-Diretor de operações da própria Cedae, capaz de, tecnicamente, resolver o problema pelo menos para os próximos 30/40 anos.
O lago da represa de Ribeirão das Lages, em Piraí, tem volume de água disponível para que se faça uma linha exclusiva visando o atendimento da demanda de água da Baixada Fluminense. Para isso bastam apenas alguns estudos sobre a necessidade ou não da construção de uma estação de tratamento específica e o assentamento de tubulações para trazer essa água até os reservatórios locais e distribuída-la a população.
Falando assim pode parecer um projeto simples, mas é complexo, muito complexo, e tem um custo, cerca de 300 milhões de reais. Este seria o preço aproximado do fim do nosso sofrimento pelo menos no que diz respeito ao abastecimento de água tratada. Se a gente considerar que só a reforma do Maracanã vai custar  aos nossos bolsos mais de 1 bilhão de reais, não se trata, nem de longe, de uma missão impossível.
Se tecnicamente, no entanto, o projeto para matar a sede da população da Baixada é plenamente viável, politicamente a história é outra. Teríamos que superar nossas limitações e fazer com que a sociedade da região, além das lideranças políticas, comprassem o projeto. Teríamos que estabelecer uma relação entre os Prefeitos e Vereadores da região que estivesse muitos decibéis acima da mera conveniência política e partidária. Teríamos que adquirir, entre nós, uma consciência coletiva capaz de superar os inúmeros obstáculos que nos afastam e lutar por uma causa comum, a qualidade de vida e a dignidade das pessoas que moram em nossas cidades.
Considero que Duque de Caxias, por ser a cidade mais importante da região, tem todas as condições do mundo para convocar, imediatamente, formuladores, técnicos, líderes políticos e sociedade em geral para debater e defender um projeto assim, que vise atender a Baixada, dando a população água de beber, um elemento essencial à vida e a dignidade humana.

Vicente Portella